COMENTÁRIOS SOBRE A RECENTE REGULAMENTAÇÃO DO REGIME TRABALHO REMOTO/HOME OFFICE E AS IMPLICAÇÕES LEGAIS DECORRENTES.

Após o período de pandemia mundial, iniciado em março de 2020, em decorrência da COVID-19, a sociedade precisou se reinventar e se adequar ao momento vivenciado, em virtude do necessário distanciamento social. Graças aos avanços tecnológicos, à crescente qualidade dos serviços de internet, os quais viabilizaram atendimentos a distância e a implementação do trabalho remoto ou home office, os impactos do lockdown foram minimizados.

Segundo um estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), 11% trabalhadores ativos no Brasil exerceram suas atividades profissionais de forma remota no ano de 2020, (https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=38289).

No contexto atual, mesmo após o controle da crise sanitária e o retorno às atividades regulares, muitos profissionais e organizações optaram pela manutenção do trabalho remoto, ou mesmo pela adoção do sistema laboral híbrido, modelo em que o empregado labora de forma presencial e remota, podendo uma forma se sobrepor a outra, de acordo com o entabulando entre os interessados. O fato é que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) se mostra insuficiente e aquém do novo contexto laboral descortinado, no que concerne a regulamentação da nova modalidade de contratação e as peculiaridades dela decorrentes.

Mesmo após a reforma trabalhista, realizada em meados de 2017, a qual promoveu a inserção de novas disposições ao artigo 75 da CLT, o qual disciplina sobre o regime de tele-trabalho e home office, as modificações realizadas não contemplaram, e nem poderiam, a necessidade nascida em virtude da pandemia do COVID-19. Visando atender a demanda necessária, no último dia 28 de março o Governo Federal publicou a Medida Provisória nº1108/22, a que já ficou conhecida como MP do Home Office.

Medidas provisórias têm força de lei assim que publicadas no “Diário Oficial da União”. No entanto, precisam ser aprovadas pelo Congresso Nacional, dentro do prazo de 120 dias, para valer em definitivo ou podem “caducar”.

O objetivo da MP 1108/22 é atender a necessidade imediata de regulamentação da nova forma de trabalho, seja em home office ou híbrida (parte na empresa e parte em home office), e possibilitar a sua prática ofertando aos empresários e empregados um cenário de menor insegurança jurídica.

Abaixo, elenca-se os principais pontos abordados na Medida Provisória, os quais devem ser considerados por quem pretenda adotar o regime de trabalho remoto, ou mesmo do trabalho híbrido:

· A prestação de serviços na modalidade de tele-trabalho ou trabalho remoto deverá constar expressamente do contrato individual do trabalhador;

· O acordo individual poderá dispor sobre os horários e os meios de comunicação entre empregado e empregador, desde que assegurados os repousos legais.

· Possibilidade de adoção do modelo híbrido pelas empresas, com prevalência do trabalho presencial sobre o remoto ou vice-versa;

· A modalidade de tele-trabalho poderá ser realizada por jornada ou por produção ou tarefa;

· Para os casos em que não for exigível o controle de jornada, o empregado poderá escolher o melhor horário para cumprir suas tarefas;

· Caso a contratação seja por jornada, a MP permite o controle remoto da jornada pelo empregador. Todavia, caso a jornada seja ultrapassada, deverão ser pagas as horas extras respectivas;

· Prioridade na escolha para o regime de tele-trabalho dos empregados com deficiência ou com filhos de até quatro anos completos;

· O regime de tele-trabalho é estendido a aprendizes e estagiários;

· O comparecimento do empregado no ambiente de trabalho para tarefas específicas, ainda que de forma habitual, não descaracteriza o trabalho remoto.

· Haverá a possibilidade de reembolso para os funcionários que trabalharem em home office, e as empresas ficam autorizadas a pagar eventuais gastos dos trabalhadores com luz, internet e equipamentos, por exemplo.

· Para o tele-trabalho em outra localidade, deve ser observada a legislação vigente no local da contratação. Todavia, há a possibilidade de o empregado se deslocar para outro país durante o período.

Em que pese a necessidade de votação e aprovação pelo Congresso Nacional, a regulamentação prevista na MP nº 1108/2022 está em vigor e deve ser observada nas contratações que envolvam labor em trabalho remoto ou mesmo para o caso de jornada de trabalho híbrida em todo o território nacional.

Caso a Medida Provisória nº1108 não seja votada no prazo de 120 dias, seu texto perderá a eficácia. Todavia, os efeitos gerados no período compreendido entre a data de sua publicação e a fim de sua vigência não serão afetados.

Para além da regulamentação do trabalho remoto, a questão principal diz respeito a mudança no cenário laboral até então praticado. Ou seja, o trabalho remoto, ou mesmo o regime de trabalho híbrido são uma realidade que não podem ser ignoradas. A sociedade está em constante evolução e como tal, demanda a atualização e adaptação da legislação existente, de modo que a realidade vivenciada possa ser contemplada pelos diplomas legais em vigor.

Os empregadores que desejam se orientar neste novo cenário e evitar problemas futuros ocasionados por impasses na contratação nesta nova modalidade, ou mesmo em virtude do receio quanto a um eventual passivo trabalhista, principalmente caso não haja a votação necessária da MP em 120 dias, devem se nortear pela legislação trabalhista existente, pelas normas constitucionais vigentes, assim como pelos Princípios inerentes à seara trabalhista, tais como Princípio da Proteção e Princípio da Inalterabilidade Contratual Lesiva.

O empregador deve ter em mente a hipossuficiência do empregado, nas relações celetistas, via de regra. Considerar a contratação laboral por este prisma, será um grande diferencial para que as adaptações necessárias possam ser colocadas em prática a ensejar menos riscos ao empresário.

Para conferir o texto integral da MP 1108/2022 clique aqui:

https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/medida-provisoria-n-1.108-de-25-de-marco-de-2022-388651514